Não é surpresa para ninguém o fato de que Chernobyl tornou-se sinônimo de catástrofe. Essa constatação está intimamente ligada ao desastre nuclear ocorrido na madrugada do dia 25 de abril 1986, recentemente trazido de volta aos olhos do público através da popular série de TV de mesmo nome. Esse acidente causou milhares de problemas de saúde e transformou uma área antes bastante populosa em uma cidade fantasma, resultando até mesmo na criação de uma zona de exclusão de aproximadamente 2.600 km².
No entanto, a zona de exclusão de Chernobyl não é desprovida de vida, até porque lobos, javalis e ursos retornaram tempos depois às belas florestas que cercam a antiga usina nuclear. E quando se trata de vegetação, quase todas as plantas, exceto as mais vulneráveis e expostas, nunca sequer chegou a morrer completamente. Para se ter uma ideia, mesmo nas áreas mais afetadas pela radiação, a vegetação conseguiu se recuperar em, no máximo, três anos. Por outro lado, seres humanos e outros mamíferos não teriam como sobreviver caso recebessem a quantidade de radiação recebida pelas plantas nessas áreas mais contaminadas. Então, por que a vida vegetal nos arredores de Chernobyl conseguiu se tornar tão resistente à radiação causada pelo desastre nuclear?
Compreendendo algumas diferenças cruciais entre animais e plantas
Bem, para responder a essa pergunta, primeiro precisamos entender como a radiação dos reatores nucleares afeta as células vivas. Em termos básicos, o material radioativo proveniente da antiga usina de Chernobyl é “instável”, pois está constantemente lançando partículas e ondas de alta energia que destroem estruturas celulares ou produzem substâncias químicas reativas que atacam o mecanismo das células. A maioria das partes das células até são substituíveis caso sejam danificadas, mas o DNA é uma exceção crucial.
É exatamente por isso que, em altas doses de radiação, o DNA se torna “truncado” e as células morrem rapidamente. Doses mais baixas podem causar danos mais sutis na forma de mutações que alteram o funcionamento da célula, como por exemplo ao fazer com que ela se torne cancerosa, se multiplique descontroladamente e se espalhe para outras partes do corpo. Nos animais, esse tipo de reação costuma ser fatal, pois suas células e sistemas são altamente complexos e inflexíveis. Em outras palavras, a biologia animal pode ser descrita como uma máquina complexa na qual cada célula e órgão tem um lugar e um propósito, de modo que todas as partes devem trabalhar e cooperar para que o indivíduo sobreviva. Por exemplo, um ser humano não pode viver sem cérebro, coração ou pulmão.
Por outro lado, as plantas tendem a se desenvolver de uma maneira muito mais flexível e orgânica. De fato, como as plantas não podem se mover, elas não têm outra escolha senão se adaptar às circunstâncias em que se encontram. Por isso, em vez de ter uma estrutura previamente definida, como no caso dos animais, as plantas basicamente criam as coisas “à medida que se desenvolvem”. Por exemplo, o desenvolvimento de raízes mais profundas ou um caule mais alto são ações que dependem do equilíbrio dos sinais químicos de outras partes da planta, assim como condições de luz, temperatura, água e nutrientes disponíveis em sua região.
Uma questão de resistência e adaptação
Com tudo isso que foi falado, fica mais fácil de compreender que, ao contrário das células animais, quase todas as células vegetais são capazes de criar novas células de qualquer tipo que a planta precise. É por isso que um jardineiro pode cultivar novas plantas a partir de pequenas mudas, muitas vezes provenientes até de raízes brotando do que antes era um caule ou uma folha. Na prática, tudo isso significa que as plantas podem substituir células mortas ou tecidos muito mais facilmente do que os animais, independente do dano ter sido causado pelo ataque de um animal ou, no caso de Chernobyl, pela radiação.
Além disso, embora a radiação e outros tipos de danos no DNA até possam causar certos tipos de tumores nas plantas, as células mutadas geralmente não são capazes de se espalhar de uma parte da planta para outra como os cânceres que conhecemos, graças às paredes rígidas e interligadas que cercam as células dos vegetais. Também vale destacar que esses tumores também não são fatais na grande maioria dos casos, simplesmente porque a planta pode encontrar maneiras bem engenhosas de recuperar o tecido defeituoso.
Curiosamente, além de toda essa resistência inata à radiação, algumas plantas que vivem na zona de exclusão de Chernobyl parecem fazer o uso de mecanismos extras para proteger seu DNA, consequentemente mudando sua química para torná-lo bem mais resistente a danos e ativando sistemas para recuperá-lo, caso a prevenção não apresente resultados satisfatórios. Outra coisa que pouca gente sabe é que os níveis de radiação natural na superfície da Terra eram muito maiores no passado distante, de modo que as plantas na zona de exclusão podem estar usando adaptações que remontam a esse tempo para sobreviver mesmo em ambientes com características notavelmente adversas.
Uma nova vida
É importante mencionar que uma nova vida está agora prosperando em torno de Chernobyl. De fato, as populações de muitas espécies de plantas e animais são até maiores do que eram antes do desastre, o que de certo modo é bom, até porque dada a trágica perda e encurtamento de vidas humanas associadas a Chernobyl, esse ressurgimento da natureza pode ser visto como uma da poucas coisas positivas que aconteceram no período pós-acidente.
Embora a radiação promova efeitos comprovadamente prejudiciais na vida das plantas, o fato é que, se os recursos que sustentam a vida forem abundantes, a vida certamente florescerá. Outro ponto que merece menção é que a carga trazida pela radiação em Chernobyl tende a ser cada vez menos severa. Por isso, a região atual nos arredores da antiga usina surpreendentemente consegue promover uma das maiores reservas naturais da Europa, sendo um ecossistema que sustenta mais vida do que antes, mesmo que cada ciclo individual dessa vida dure um pouco menos.
Ou seja, de certa forma, o desastre de Chernobyl revela a verdadeira extensão dos impactos causados pelas ações dos seres humanos no planeta. Também é interessante pensar que, por mais prejudicial que tenha sido, o acidente nuclear foi muito menos destrutivo para o ecossistema local do que para as vidas humanas. Desse modo, podemos dizer que a evacuação dos humanos da área curiosamente acabou criando um espaço ideal para a natureza pudesse retornar com toda a sua força.
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