Em Viena, uma adolescente se afogou enquanto segurava uma partitura. Em Budapeste, um lojista se matou e deixou um bilhete que citava a letra da mesma música representada na partitura citada anteriormente. Em Londres, uma mulher morreu por conta de uma overdose enquanto ouvia um disco dessa mesma canção repetidas vezes. Sinistro, não? Pois bem, a tal música que conecta todas essas mortes se chama “Gloomy Sunday” (“Domingo Sombrio” em português). Apelidada de “canção suicida”, ela já foi associada a mais de cem suicídios, incluindo o do homem que a compôs.
Por conta desses acontecimentos, a história em torno da canção Gloomy Sunday se tornou um grande mistério, muito embelezada até certo ponto. Apesar de muitos dos detalhes envolvendo os supostos suicídios ligados à música não contarem com informações concretas, as questões envolvendo Gloomy Sunday já foram amplamente divulgadas em jornais e revistas populares, despertando a curiosidade de muita gente sobre o assunto
Obviamente, a música pode ter um impacto profundo na mente humana e suas emoções, mas será que ela pode realmente causar mais de cem mortes por suicídio? É isso o que vamos explorar ao longo desse post!
Em 1933, o compositor e pianista húngaro Rezső Seress fez o que os músicos ainda fazem nos dias atuais: expressar seus sentimentos através da música. A história conta que depois que sua namorada o deixou, ele estava tão deprimido que resolveu compor a melodia que se tornaria “Gloomy Sunday”. Essa melodia recebeu uma lírica igualmente melancólica, em húngaro, do amigo de Seress, o poeta Laszlo Javor.
Alguns relatos afirmam que foi a namorada de Javor que o deixou, o que supostamente fez com que ele criasse primeiramente um poema. Outros dizem que Seress escreveu a sua própria letra, inicialmente sobre temas como guerra e apocalipse, sendo que Javor depois resolver transformá-la em uma canção sobre um “coração partido”. Seja qual for o caso, “Szomorú Vasárnap”, como a música foi originalmente intitulada, não fez muito sucesso no início, mas dois anos depois, uma versão gravada por Pál Kálmar começou a ser relacionada a uma onda de suicídios na Hungria.
Além disso, acredita-se que, quando a música se tornou um sucesso, Seress tentou reatar o relacionamento com a mulher que supostamente serviu de inspiração para a música. Infelizmente, ele descobriu que ela havia se envenenado e havia morrida com uma cópia da partitura de sua música nas proximidades. Apesar de não haver informações que comprovem que esta história é verdadeira ou não, o que é realmente verdade é que o próprio Seress cometeu suicídio em 1968, saltando da janela de um prédio de apartamentos em Budapeste.
Pelo menos dezoito mortes por suicídio na Hungria já foram relatadas como tendo alguma relação com Gloomy Sunday. No artigo de uma edição da revista Time publicada em 30 de março de 1936, o autor da publicação descreveu vários suicídios relacionados. Por exemplo, um sapateiro húngaro com o nome de Joseph Keller havia deixado um bilhete no lugar onde tinha cometido suicídio citando alguns versos de Gloomy Sunday.
Em outro caso, vários corpos haviam sido encontrados no Rio Danúbio com as mãos segurando a partitura da música. Além disso, em outra ocasião, outras duas pessoas se mataram enquanto ouviam uma banda tocar a tal música. Por conta dessas casos, a canção acabou sendo banida na Hungria. No entanto, os relatos não ficaram isolados no território húngaro. Na década de 1930, tanto a Times quanto o New York Times relataram suicídios e tentativas de suicídio nos Estados Unidos e na Inglaterra ligados a Gloomy Sunday.
Mas apesar dos relatos conflitantes, a música nunca foi oficialmente proibida nos EUA, apesar de realmente ter sido banida na Inglaterra. No início dos anos 40, a rede BBC considerava a música “muito perturbadora para o público”, se comprometendo a tocar apenas as versões instrumentais no rádio. Outras fontes sugerem que mais de cem suicídios já foram relacionados à Gloomy Sunday, mas o fato é que nem todas essas mortes chegaram a ser totalmente comprovadas.
Muitos psicólogos apontam que a possível explicação para tantos suicídios relacionados à música, especialmente os que aconteceram inicialmente na Hungria, pode estar ligada ao “clima sombrio” e “perfeitamente propício ao suicídio” da época em que a música foi composta, a década de 1930. Naquela época, a Grande Depressão, considerada o pior e o mais longo período de recessão econômica do século XX, estava no seu auge. Tanto é que, nesse período, já era possível notar que as taxas de suicídio estavam disparando em países como os EUA e a própria Hungria.
Além disso, o anti-semitismo estava tomando conta da Europa. De fato, nessa época, o próprio Rezső Seress acabou sendo internado em um campo de trabalho nazista na Ucrânia. Ele sobreviveu ao acampamento, mas sua mãe não teve a mesma sorte. Por isso, muitos especialistas acreditam que esses eventos construíram um enredo perfeitamente sombrio para que Seress pudesse compor Gloomy Sunday. Assim, ele compôs a canção colocando todos os seus sentimentos, incluindo suas tristezas e decepções, na composição.
Outro ponto que merece destaque é que Seress compôs a música em Dó menor, uma escala que na teoria musical é geralmente usada para compor músicas “tristes”, o que pode ter se “agravado” ainda mais com as letras melancólicas criadas posteriormente.
Embora Gloomy Sunday tenha se tornado uma lenda musical sinistra, fazendo com que as pessoas se perguntassem se era realmente possível que uma canção pudesse levar alguém a cometer suicídio, o fato é que isso está longe de ser realmente o caso. Na verdade, tudo tem a ver com a reputação que essa música obteve por causa de suas origens e o seu contexto histórico, que por si só já era propício a um grande número de casos de suicídio, seja por questões econômicas, sociais ou estritamente pessoais. Além disso, essa música ainda pode ser usada para fins suicidas porque a história que ela retrata se transformou em uma referência popular para o suicídio.
Então, não se preocupe, você não vai se suicidar se ouvir essa música. Ela não é amaldiçoada nem foi criada com o propósito de fazer com que as pessoas cometam suicídio. De fato, ela é uma música muito triste, mas você pode muito bem aproveitar a sua melodia sem correr o risco de sentir vontade de acabar com a sua própria vida.
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