Em agosto, o presidente dos EUA, Donald Trump causou polêmica quando manifestou interesse em comprar a Groenlândia, a maior ilha do mundo, que oscila à beira do gelado Oceano Ártico. O problema é que a Groenlândia não está à venda e Trump foi amplamente ridicularizado por esse mal-estar diplomático. No entanto, muitos se perguntaram o que poderia estar por trás desse movimento sem precedentes e se isso poderia ter algo a ver com o crescente interesse dos Estados Unidos em possuir uma fatia do Ártico.
Os EUA são um dos oito países que cercam o Ártico, juntamente com Canadá, Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega, Rússia e Suécia, que estão atualmente disputando a posse dos mares congelados da região, que não pertencem a ninguém, pelo menos não oficialmente. Vários desses países já apresentaram documentos formais a um órgão das Nações Unidas, reivindicando partes do vasto leito marinho do Ártico.
As mudanças climáticas também estão abrindo as águas anteriormente bloqueadas pelo Ártico, tornando a região mais acessível do que nunca. De fato, com base nas tendências atuais, existem previsões que indicam que o Ártico estará completamente livre de boa parte do seu gelo por volta de 2040 ou 2050. Curiosamente, essa onda de interesse na região foi apelidada de “corrida pelo Ártico” ou “a nova Guerra Fria”, dada as condições climáticas locais e o fato de que Rússia e Estados Unidos são os principais envolvidos.
Mas, apesar das oportunidades que a região apresenta, o Oceano Ártico pode realmente ser possuído por alguém? E por que tantos países querem uma participação nesse lugar que só tem icebergs e ursos polares à deriva? São essas as questões que vamos abordar ao longo desse post!
Há uma resposta bem direta para essa pergunta: o Ártico possui enormes reservas de petróleo e gás. O fundo do Oceano Ártico abriga cerca de 90 bilhões de barris de petróleo, aproximadamente 13% das reservas de petróleo não descobertas do mundo e cerca de 30% do gás natural inexplorado do planeta, de acordo com o Departamento de Energia dos Estados Unidos.
Um século atrás, essa imensa riqueza mineral seria inacessível, porque nos faltava a tecnologia para explorá-la. Naquela época, os países limitavam-se a explorar apenas uma fina faixa de mar ao longo de suas costas. Só que, com os enormes avanços tecnológicos das últimas décadas, trechos remotos do oceano se tornaram cada vez mais acessíveis. Consequentemente, isso forçou os legisladores internacionais a expandirem as legislações que regem onde os países podem explorar recursos legalmente.
Atualmente, sob um tratado chamado Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (UNCLOS), os países signatários podem explorar recursos do fundo do mar a 370 quilômetros de suas costas. No entanto, se um país puder fornecer evidências de que características geológicas específicas no fundo do mar (localizadas mais longe desse limite) estão conectadas à massa terrestre continental do seu território, a jurisdição da nação em questão pode ser expandida mais profundamente.
No Ártico, essa abordagem coloca grandes extensões de oceano antes intocáveis em disputa pelas nações vizinhas. Muitas de suas reivindicações agora se concentram na dorsal de Lomonosov, uma enorme característica geológica do fundo do mar que se estende pelo Oceano Ártico. Várias nações afirmam que essa cordilheira é uma extensão de suas plataformas continentais, uma reivindicação que poderia conceder acesso às áreas do fundo do mar do Ártico e, consequentemente, abrir espaço para uma vasta riqueza mineral.
Tudo isso aponta para um futuro em que diferentes nações possuirão pedaços do Oceano Ártico, cada um com graus variados de poder. A Rússia e o Canadá, por exemplo, estão apostando nas duas maiores reivindicações, o que inevitavelmente daria a essas nações mais influência regional. No entanto, a divisão do Ártico provavelmente não acontecerá muito em breve, pois reunir evidências sobre os supostos direitos de cada país e elaborar relatórios detalhados sobre o mar é um procedimento intensivo que está apenas começando.
De fato, o processo de decisão sobre essas reivindicações possivelmente levará décadas. Além disso, mesmo que os países obtenham a aprovação para explorar os recursos naturais, eles terão que arcar com as enormes despesas de levar seus navios ao Ártico e construir estruturas em alto mar para extrair petróleo e gás de quilômetros abaixo da superfície.
É importante deixar claro que explorar recursos no Ártico não se trata apenas de “derreter o gelo”. O Ártico ainda é um ambiente isolado e relativamente desconhecido aos olhos dos seres humanos. Ainda existem mares e icebergs difíceis de serem dominados e é muito difícil conseguir um ambiente totalmente seguro para operar. No fim das contas, existe todo um conjunto de questões pertinentes que precisam ser respondidas.
Com tudo o que foi dito, podemos concluir que as reivindicações dos países com relação ao direito de propriedade do Ártico ainda são bastante antecipatórias. Muito do que está sendo discutido não tem nada a ver com necessidade imediata. Na prática, trata-se de algo como “vamos conseguir o que podemos no âmbito da UNCLOS para ter acesso a todo esse espaço no futuro”, o que pode ser um grande problema, dada a escassez de informações concretas sobre os impactos das possíveis explorações no Ártico.
Por outro lado, alguns cientistas ambientais permanecem cautelosamente otimistas, pois ainda que o Ártico torne-se propriedade de alguma nação e seja explorado, isso não significa necessariamente que ele será destruído. No entanto, isso só poderá ser garantido com a aplicação de leis bastante específicas.
Ainda assim, devemos nos preocupar agora com o que o direito de propriedade acabará fazendo com o Ártico, mesmo que essa realidade ainda esteja a décadas de se concretizar? As disputas de nações pelo acesso ao petróleo na região poderiam desencadear uma guerra? E como o afluxo de países famintos por recursos afetará a frágil ecologia da região? Infelizmente, essas são algumas das questões que só o futuro poderá nos dar alguma resposta…
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