Quando Aarushi Talwar, de 13 anos, foi encontrada morta com a garganta cortada em seu quarto em Noida, Índia, em 16 de maio de 2008, as autoridades imediatamente questionaram seus pais para tentar obter respostas. Como os casos de suicídio por cortes na garganta são raros, a polícia estava certa desde o início de que estavam lidando com um homicídio.
No entanto, a investigação que se seguiu acabou por ser tudo menos simples. De fato, foram tantas reviravoltas ao longo de um período tão longo que o caso se transformou em uma investigação de proporções quase sem paralelo.
No início, o principal suspeito era Hemraj Banjade, 45 anos, que foi contratado como servente para ajudar nos afazeres da casa de Rajesh e Nupur Talwar, pais de Aarushi. O problema é que ele também foi encontrado morto apenas um dia depois da morte de Aarushi Talwar. Seu corpo foi encontrado parcialmente decomposto no terraço da casa.
Mesmo com dois assassinatos agora em mãos, as autoridades indianas falharam em muitos aspectos da investigação, inclusive não protegendo a cena do crime após a morte de Aarushi Talwar, além de permitir que a mídia e um público curioso se aventurassem no local nas horas após o assassinato. Mas ainda com todos esses contratempos, a investigação rapidamente encontrou seu alvo, que seriam aqueles com maior acesso e motivo em potencial para cometer os dois assassinatos: os próprios pais de Aarushi.
Filha de dois dentistas, Aarushi Talwar era uma estudante de uma escola pública e morava no Setor 25 de Noida com seus pais, Rajesh e Nupur Talwar, que trabalhavam em uma clínica no Setor 27, bem como no Hospital Fortis, onde Rajesh dirigia o departamento odontológico. Anita e Praful Durrani, amigos íntimos dos Talwars, compartilhavam a clínica de Noida com o casal. Assim, Rajesh e Anita pegavam os turnos da manhã das 9h ao meio-dia, enquanto Praful e Nupur passavam as noites a partir das 17h às 19h.
Às 6:01 da manhã de 16 de maio, a campainha tocou. Era a empregada doméstica Bharti, que estranhou o fato de ter que tocar a campainha mais três vezes para ser finalmente recebida por Nupur, que estava na varanda. Curiosamente, isso também era extremamente incomum, já que a mãe de Aarushi costumava dormir naquele horário porque trabalhava no turno da noite no escritório. Assim, Banjade era quem cuidava de deixar os empregados ou convidados entrarem.
O portão da entrada estava trancado por fora, então Nupur teve que atirar um conjunto de chaves para Bharti. Quando a empregada entrou na casa, ela logo percebeu que Rajesh também estava acordado. Ambos os pais estavam no quarto da filha, chorando e dizendo: “Veja o que Hemraj fez”. Foi então que Bharti viu Aarushi Talwar imóvel em uma poça de sangue, com sua garganta cortada por uma faca. Ela correu para buscar os vizinhos e alguma assistência médica, mas já era tarde demais para ajudar a garota.
Rajesh e Nupur alegaram não ter ouvido um único som enquanto o assassinato acontecia por conta do aparelho de ar-condicionado. Quando a polícia chegou às 7h15 da manhã, havia uma multidão de pessoas chamadas pelos pais da garota. Em termos de adulteração na cena do crime, ter dezenas de pessoas contaminando a integridade das evidências de DNA foi algo bastante flagrante. De fato, muitas das 28 amostras de impressões digitais que a polícia retirou da cena do crime estavam borradas e inúteis.
Quando os médicos foram visitar a residência dos Talwars para checar como os pais da garota estavam emocionalmente, eles notaram manchas de sangue na maçaneta da porta do terraço, que ainda estava trancada. Eles também notaram pegadas ensanguentadas no chão e manchas de sangue na escada.
As chaves do terraço foram solicitadas a Rajesh, mas ele resolveu entrar sozinho no local depois que notou o sangue na maçaneta da porta. Ele ficou lá dentro por um dia inteiro, de modo que a polícia ficou incapaz de acessar o terraço.
O corpo de Banjade foi descoberto no dia seguinte, 17 de maio. Havia evidências de que os dois corpos foram deslocados pelo apartamento. A nova narrativa era que Banjade havia sido arrastado para o terraço em um lençol. A cena do crime também parecia estar “disfarçada” e desprovida de qualquer evidência que apontasse para os Talwars. De fato, os Talwars disseram a seus empregados que limpassem o chão e as paredes do quarto com água e sabão.
Um especialista que inspecionou a cena do crime pela primeira vez disse que os assassinatos foram cometidos por alguém “muito próximo de Aarushi”. Também havia evidências de que ela havia feito sexo e que sua vagina havia sido penetrada e posteriormente limpada por alguém. No entanto, não foi encontrado sêmen.
Com isso, a polícia suspeitou que Rajesh Talwar encontrou seu servo e sua jovem filha envolvidos em atividades sexuais, assassinando a sua filha como uma espécie de “matança de honra” e matando Banjade por supostamente estuprá-la. Outra teoria era que o próprio Rajesh havia se envolvido em relações extraconjugais e foi confrontado por sua filha e chantageado por Banjade.
Ainda assim, os pais de Aarushi afirmavam que os policiais estavam tentando enquadrá-los como assassinos para encobrir a forma errada que eles lidavam com a investigação antes de entregá-la ao CBI, a principal agência de investigação da Índia. Mas o que parecia claro para o CBI desde o início era que esse era um trabalho interno. Quem matou Aarushi e Banjade tinha acesso à casa, pois não havia sinais de entrada forçada e o portão da propriedade estava trancado do lado de fora.
Porém, o que chamava a atenção era o motivo pelo qual o assassino deixaria Banjade apodrecendo no terraço, principalmente se os responsáveis morassem lá. Uma teoria postulada pelo CBI era que o corpo estava escondido lá para ser descartado após a conclusão da investigação da cena do crime. No entanto, com tanta atenção da mídia e pessoas andando pela casa, isso não era mais uma opção viável.
Em novembro de 2013, após anos de julgamentos e procedimentos legais, Rajesh e Nupur Talwar foram condenados à prisão perpétua. A decisão foi fortemente criticada por se basear em evidências circunstanciais e pouco convincentes, de modo que os Talwars chegaram a apelar para o Supremo Tribunal de Allahabad.
Levou quatro anos, mas os pais conseguiram ser absolvidos em 12 de outubro de 2017 e permaneceram livres desde então, pois o CBI entregou sua investigação a uma outra equipe de investigação que recomendou dar o caso como inconclusivo por conta da falta de evidências, pois segundo eles a cena do crime foi extraordinariamente adulterada.
O caso permanece sem solução legal e a família aponta que o CBI, a polícia local e a mídia foram os verdadeiros responsáveis por arruinar a investigação que deveria ter resultado na identificação do assassino da filha.
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