Os séculos 18 e 19 foram tempos luminosos no campo da eletricidade. Grandes descobertas foram feitas nessa época, ao mesmo tempo em que novos projetos pareciam pavimentar um futuro cada vez mais iluminado. Consequentemente, foi também nesse período que os cientistas passaram olhar mais atentamente para as curiosas características dos animais elétricos.
De fato, ao longo dos anos, os peixes-elétricos assustaram inúmeros animais, inspiraram vários trabalhos de cientistas e até se transformaram em objeto de arte e música. No entanto, uma pergunta sempre chamou a atenção do grande público: afinal de contas, como esses peixes são capazes de produzir eletricidade?
Ao longo desse post, nós vamos explorar as principais características que fazem com que os peixes-elétricos consigam gerar uma tensão de até 860V.
O que faz com que os peixes-elétricos consigam gerar eletricidade?
Basicamente, os peixes-elétricos produzem eletricidade através de um órgão elétrico especializado. O órgão elétrico do poraquê, por exemplo, ocupa cerca de 2/3 do corpo do peixe, sendo que ele é dividido em três partes diferentes, cada uma produzindo uma natureza diferente de corrente elétrica. O órgão principal e o órgão de Hunter produzem correntes elétricas de alta dosagem, enquanto o órgão de Sach é responsável pelas baixas tensões.
Dentro do órgão elétrico, existem várias células chamadas “eletrócitos”, que por sua vez ficam dispostas em colunas empilhadas, com várias colunas paralelas umas às outras e com espaços cheios de fluido entre elas. Os eletrócitos são células modificadas de origem muscular (na maioria dos casos) ou neural, de modo que essas células são as responsáveis em gerar a carga elétrica do poraquê.
Desse modo, o número de eletrócitos em uma coluna e o próprio número de colunas são os fatores que determinam quanta eletricidade o peixe pode produzir.
Como a eletricidade é produzida?
Como os eletrócitos produzem eletricidade é algo fascinante e muito específico. Os eletrócitos têm dois lados, um lado que é inervado por um neurônio motor e um lado que é ondulado e ligeiramente amarrotado. Sua membrana possui muitos canais proteicos minúsculos que permitem seletivamente que os íons sódio (Na +) e os de potássio (K +) fluam para dentro e para fora da célula. Assim, os eletrócitos mantêm um ambiente externo positivo e um ambiente interno negativo, bombeando os íons Na + e K +.
Mediante instruções do sistema nervoso, os eletrócitos criam um dipolo. O sinal do neurônio motor faz com que os canais iônicos no lado posterior bombeiem Na + e K + para a célula, enquanto o outro lado continua bombeando os íons positivos para fora da célula. Isso fornece a um lado da célula uma carga relativamente positiva e ao outro lado uma carga negativa.
Vale destacar que o modo como os eletrócitos são empilhados também faz diferença na eletricidade que o peixe produz. O poraquê, por exemplo, pode ter até 6.000 eletrócitos em uma coluna.
Para que esses peixes usam toda a sua energia elétrica?
A maioria dos peixes-elétricos usa a sua eletricidade como uma ferramenta de defesa ou até mesmo de caça. Para peixes de água doce, como o poraquê, que vive nas águas escuras da Amazônia, a eletricidade também pode substituir um sentido, como a visão. Isso geralmente ocorre porque esses peixes ativam um campo elétrico em suas membranas para coletar informações sobre o ambiente. Assim, esses eletrorreceptores agem como voltímetros, detectando as mudanças no campo elétrico causadas pelo ambiente e determinando se algo pode servir como um “jantar”.
Curiosamente, dois peixes-elétricos com frequências de descarga semelhantes podem se chocar, causando a sobreposição de seus campos elétricos. Para evitar interferências causadas pelos dois sinais, os peixes-elétricos desenvolveram um mecanismo inteligente de prevenção de interferência. Na prática, esse mecanismo coleta informações do outro peixe para mudar rapidamente a frequência do seu campo elétrico.
Por sua vez, a estratégia de caça desses peixes é particularmente interessante. Eles geralmente começam enviando pequenos impulsos de eletricidade para atordoar o sistema nervoso de sua presa. Após a saraivada inicial de pulsos, eles geram uma corrente mais forte para matar as presas. No caso dos poraquês, eles podem até se enrolar em torno de suas presas para paralisá-las completamente. Na prática, essa estratégia permite que o poraquê maximize o impacto de seu choque.
Também vale mencionar que a cabeça do poraquê é positiva em comparação com a cauda, que é mais negativa. Esse tipo de peixe apresenta essa característica devido à direção do fluxo de carga positiva através de seu órgão elétrico. Basicamente, ele coloca a cabeça carregada positivamente em uma extremidade da presa e a cauda carregada negativamente na outra extremidade e envia as ondas de choque. Feito isto, só resta ao poraquê saborear a sua refeição.
Por que os peixes-elétricos não sofrem choques com a própria eletricidade gerada?
Para responder a essa pergunta, precisamos entender que o órgão elétrico dos peixes-elétricos costuma ser preenchido com um tecido adiposo e conjuntivo. Desse modo, quando eles liberam uma descarga elétrica, esses tecidos isolam o peixe de sua própria tática ofensiva.
Além disso, o tamanho do animal também desempenha um papel nesse quesito, pois a maioria dos peixes fortemente elétricos são muito maiores em tamanho do que suas presas. Desse modo, a corrente deles até pode causar grandes danos em presas de menor tamanho, mas não pode fazer muitos estragos em um corpo maior. Em outras palavras, seria como comparar a força de uma criança com a de um adulto.
No entanto, é importante deixar claro que os peixes-elétricos ainda têm muito a ensinar aos cientistas sobre como a eletrolocalização funciona e como esses peixes brilhantes evoluíram de uma forma tão intrigante. Por isso, só nos resta esperar que mais segredos sobre essas criaturas fascinantes sejam desvendados no futuro.
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